NOVA LEI LIMITA A ESCOLHA DO FORO EM CONTRATOS: NOVAS REGRAS PROCESSUAIS.
A alteração do artigo 63 do Código de Processo Civil (CPC), promovida pela Lei nº 14.879/2024, trouxe importantes limitações à autonomia contratual no que se refere à cláusula de eleição de foro em contratos civis e empresariais.
A nova norma passou a impedir a imposição unilateral de foro por empresas em contratos de adesão, medida que visa promover equilíbrio processual e evitar práticas abusivas em relações contratuais assimétricas.
Nesse contexto, trazemos os dispositivos legais afetados, os fundamentos da alteração normativa, os impactos para as empresas e consumidores, bem como os reflexos práticos no contencioso civil.
Acompanhe até o final!
Alteração Legislativa e Fundamento Jurídico.
A redação original do art. 63 do CPC permitia ampla liberdade às partes para estipularem, de comum acordo, o foro competente para dirimir controvérsias oriundas do contrato.
A Lei nº 14.879/2024, sancionada em 4 de junho de 2024, introduziu limites à validade dessa cláusula nos contratos de adesão.
Assim, a cláusula apenas será válida se fixar o foro do domicílio da parte que aderiu ao contrato ou se houver opção posterior, em processo judicial, pela parte aderente.
Essa mudança se alinha ao princípio da proteção da parte hipossuficiente e visa inibir o uso estratégico da cláusula de foro pelas empresas para dificultar o acesso à Justiça pelo contratante mais vulnerável.
Qual o Contexto da Modificação e a Reação do Judiciário?
A alteração foi motivada por frequente insatisfação de órgãos jurisdicionais, especialmente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), com o número elevado de processos que envolviam cláusulas de eleição de foro estipuladas de forma unilateral por grandes empresas, concentrando ações fora do domicílio do consumidor ou contratado.
Na prática, bancos, administradoras, seguradoras e plataformas digitais centralizavam o julgamento de seus litígios em determinadas comarcas, muitas vezes distantes do local de residência do aderente.
Essa prática, embora respaldada pelo pacto entre as partes, produzia desigualdade de tratamento e criava obstáculos logísticos e financeiros ao acesso jurisdicional.
A nova norma atende à crescente preocupação do Judiciário com o respeito ao princípio do devido processo legal e da isonomia entre as partes, promovendo uma correção de rota na interpretação da autonomia contratual em contratos de adesão.
Contratos de Adesão: Conceito e Aplicabilidade.
Os contratos de adesão são aqueles elaborados pela parte fornecedora de forma unilateral, sem possibilidade de o consumidor ou o contratante modificar ou discutir pontos essenciais ao conteúdo.
O art. 54 do CDC define esses contratos como aqueles em que o consumidor apenas adere às condições previamente elaboradas.
A nova regra do CPC se aplica integralmente a esses instrumentos, estendendo a proteção processual conferida ao consumidor às demais relações jurídicas contratuais que apresentem desequilíbrio estrutural.
Nesse ponto, a aplicabilidade das cláusulas de eleição de foro em contratos de adesão, especialmente em ações consumeristas, já vinha sendo objeto de desconsideração pela jurisprudência. A nova lei agora transforma essa orientação em comando normativo expresso.
O que estabelece o Princípio da Vedação à Surpresa e Proteção do Aderente?
O novo dispositivo legal consagra, de forma prática, o princípio da vedação à surpresa processual e a proteção da parte vulnerável na relação contratual.
A imposição de foro em localidade distante, muitas vezes desconhecida da parte aderente, compromete o direito de ação e de defesa.
Ao garantir que o foro será, por padrão, o do domicílio do aderente, a lei busca equilibrar o contraditório e assegurar maior acesso à jurisdição.
Esse movimento reforça a constitucionalização do processo civil e afasta práticas contratuais que, embora formalmente válidas, ferem a essência do devido processo legal.
Qual a Validade da Cláusula de Foro em Contratos Paritários?
É importante destacar que a limitação introduzida pela nova lei não atinge os contratos paritários, isto é, aqueles celebrados entre partes com capacidade de negociação equivalente.
Nesses casos, permanece a liberdade de escolha do foro pelas partes, desde que pactuado por consenso e de maneira expressa.
Portanto, empresas que mantêm relações comerciais entre iguais ou com clientes institucionais continuam podendo estipular cláusula de eleição de foro, desde que não se configure relação de adesão.
Quais os efeitos da Nulidade da Cláusula e Competência Residual?
Com a nulidade da cláusula que fixar foro diverso do domicílio do aderente, a competência será determinada pelas regras gerais do Código de Processo Civil. Ou seja, aplica-se o critério do domicílio do réu ou da sede do cumprimento da obrigação, conforme a natureza da ação.
O juiz poderá, de ofício, reconhecer a incompetência relativa quando a cláusula for manifestamente inválida por contrariar o novo art. 63.
Ainda, o foro eleito de forma abusiva poderá ser desconsiderado mesmo que haja cláusula expressa, uma vez que a nova norma possui natureza de ordem pública nas hipóteses de contrato de adesão.
Principais recomendações para Empresas e Redação Contratual.
As empresas que utilizam contratos padrão precisam revisar as cláusulas de eleição de foro de forma a adequar às novas regras.
A permanência de cláusulas que fixem foro distante do domicílio do aderente pode comprometer a validade da cláusula e expor a empresa a discussões judiciais, nulidades e deslocamentos de competência.
Sugere-se:
- Verificar a natureza jurídica dos contratos firmados (adesão ou paritários);
- Adequar as cláusulas de foro ao domicílio do contratante, quando se tratar de relação não negociada;
- Instruir os departamentos jurídicos e comerciais sobre a nova legislação;
- Evitar cláusulas genéricas que possam ser interpretadas como abusivas.
Por fim, a Lei nº 14.879/2024 inaugura um novo capítulo na disciplina das cláusulas de eleição de foro no ordenamento jurídico brasileiro. Ao proteger o contratante aderente e reequilibrar a relação processual, a norma impõe nova postura contratual, exigindo responsabilidade, boa-fé e atenção às garantias constitucionais do devido processo.
Empresas e profissionais do direito devem se atualizar sobre as novas balizas legais e revisar seus instrumentos contratuais com atenção redobrada. O descumprimento da norma pode implicar em nulidades, prejuízos processuais e sanções judiciais.
Contudo, é fundamental a análise de um especialista em cada caso concreto, de forma a assegurar o acesso à Justiça e da isonomia entre as partes como fundamentos essenciais do processo civil democrático.
O escritório Salloum, Becker e Camargo será um excelente parceiro para sanar dúvidas. Gostou do texto? Mande seu comentário que teremos prazer em lhe ouvir!