Contratos com a Administração Pública em tempos de pandemia: há possibilidade de reequilíbrio econômico?
Os efeitos econômicos da pandemia do coronavírus sob os negócios e as relações privadas em geral têm sido arguidos em diversas negociações e ações judiciais visando a revisão contratual, com fundamento nas teorias da imprevisão, onerosidade excessiva, caso fortuito ou força maior, provenientes do Direito Civil.
Mas muitas empresas que contratam com a Administração Pública, mesmo não estando sujeitas às disposições do Direito Civil sobre os contratos firmados, também sentiram os efeitos econômicos da pandemia, que dificultam, e em muitas vezes, impossibilitam a execução regular dos contratos. Teriam essas empresas a mesma prerrogativa de revisão contratual?
O Direito Administrativo (ramo do Direito aplicável aos contratos de que a Administração Pública é parte) também traz institutos que visam à garantia do equilíbrio econômico-financeiro nos contratos. Entre eles está o reequilíbrio econômico-financeiro.
Segundo a Lei de Licitações e Contratos Públicos, os contratos firmados pela Administração Pública podem ser alterados “para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual” (artigo 65, II, d, da Lei 8666/93, com destaques nossos). Trata-se de uma hipótese excepcional e que requer a concordância das partes.
Excepcional porque, naturalmente, a incerteza e imprevisibilidade são características inerentes à natureza de um contrato — quando ele é firmado, não há como prever que circunstâncias podem advir, no âmbito do contrato ou em escala regional, nacional e até mundial, de modo a afetar sua execução. Mas o dispositivo jurídico citado acima trata de situações que fogem à incerteza natural de todo contrato, às quais chamamos “álea extraordinária”, ou os fatos humanos ou naturais, como fenômenos da natureza e guerras, que não podem ser impedidos, os quais se caracterizam como caso fortuito e força maior.
Entre essas situações, muitas empresas têm se perguntando se a pandemia do coronavírus poderia ser incluída, de modo a justificar a revisão dos contratos administrativos.
A pandemia se encaixa nos requisitos para o direito ao reequilíbrio econômico-financeiro. Ela é, sem dúvidas, um fato extraordinário, exterior ao contrato, alheio ao risco empresarial assumido, não sujeito à vontade das partes, imprevisível, e que impactou e segue impactando diversas relações jurídicas de todas as naturezas.
No entanto, o que gera o direito ao reequilíbrio contratual não é o fato em si, mas sim, os seus efeitos sobre a capacidade das partes de continuar cumprindo com as obrigações contratuais. Esses efeitos precisam ser devidamente comprovados, com documentos, relatórios, imagens etc.
Se a crise sanitária, e consequentemente, econômica, causada pela pandemia do coronavírus, prejudicou a empresa, dificultando ou impossibilitando-a de seguir o curso do contrato, ela pode solicitar a revisão, demonstrando os prejuízos e/ou circunstâncias que afetam o cumprimento do contrato, seu nexo de causalidade com a pandemia e a capacidade da empresa de continuar prestando os serviços.
Naturalmente, cada caso poderá trazer condições diferentes, que merecem uma avaliação personalizada. Por isso recomenda-se às empresas que se aconselhem com advogados especializados, para que analisem o contrato e estudem as possibilidades de revisão, lembrando que tal solicitação deve culminar na instauração de processo administrativo específico.
Este é um artigo de teor informativo e não vale como consulta jurídica.