Assédio Eleitoral x Censura: uma leitura sob a ótica da cultura organizacional.
Autor: Emanoel Theodoro Salloum Silva,
OAB/PR sob nº 41.626.
Em 26 de agosto de 2022, o Ministério Público do Trabalho (MPT), mediante a Coordenadoria Nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho (COORDIGUALDADE/MPT), expediu a Recomendação 01/2022, na qual recomenda às empresas e empregadores “ABSTER-SE de ameaçar, constranger ou orientar pessoas que possuem relação de trabalho com sua organização (empregados, terceirizados, estagiários, aprendizes, entre outros) ou mesmo aquelas que buscam trabalho a votar em candidatos ou candidatas nas próximas eleições”.
Em 18 de outubro de 2022, representantes do MPT reuniram-se com ministros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) visando atuação conjunta quanto ao tema. Segundo noticiou o próprio TSE sem seu sítio eletrônico, para o presidente do TSE, o combate às fake News se complementa com o enfrentamento do assédio moral e eleitoral, pronunciando-se nos seguintes termos: “Temos que banir esse absurdo. A eleitora e o eleitor devem poder, com a sua consciência, analisando as propostas que foram feitas, escolher o melhor candidato sem qualquer interferência ilícita”.
Tudo indica que há um grave equívoco na recomendação do MPT, especificamente quando inclui a “orientação” (o verbo “orientar”) no rol das condutas passíveis de caracterização do assédio.
Muito difundido no mundo corporativo são os aspectos tangíveis e intangíveis da cultura organizacional das empresas como diferenciais competitivos. Neste contexto, o conjunto de crenças, normas, valores, expectativas e atitudes compartilhadas coletivamente por todos na empresa traduzem tal aspecto cultural. Por certo que, neste ambiente, estão compreendidos nos instrumentos de gestão empresarial a comunicação, a persuasão, a divulgação de informações e dados compatíveis com a cultura organizacional do negócio empreendido. Assim, possível e lógico vislumbrar como totalmente usual, lícito e inerente ao poder diretivo da empresa o estimulo ao engajamento dos colaborados com o perfil político mais alinhado aos valores defendidos pela organização empresarial e seus empregadores.
Neste sentido, a Constituição Federal estabelece: o livre exercício de qualquer atividade econômica (art. 170, § único); a liberdade na manifestação do pensamento (art. 5º, IV); a inviolabilidade da liberdade de consciência e crença (art. 5., VI); a proibição de privação de direitos por motivos de convicção política (art. 5º, VIII); a livre expressão de comunicação, independente de censura (art. 5º; IX); a vedação a qualquer censura de natureza política, ideológica e artística (art. 220, § 2º).
Portanto, inibir o diálogo e a orientação política nas empresas é uma inconstitucionalidade que macula a livre iniciativa e sua manifestação no poder diretivo do empregador. Uma clara tentativa de enfraquecer o debate público eleitoral, de limitar informações e a difusão do esclarecimento econômico sobre as propostas de governo dos candidatos.
Obviamente que tais liberdade constitucionais não comportam o uso de violência fisica ou moral, perseguições, chantagens, condutas vexatórias, nas quais reside o assédio moral, que quando aplicado no contexto político e eleitoral, recebe a designação de assédio eleitoral.
Ora, a própria Lei nº 7.783/89 (Lei da Greve) reconhece a licitude do emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar trabalhadores a aderirem à greve (art. 6º, I). Por qual razão estes mesmos meios não podem ser utilizados pelos empregadores para comunicação do alinhamento político mais adequado à cultura organizacional do seu negócio?
Nesta ordem de ideias, é um erro e uma inconstitucionalidade reconhecer como assédio moral e eleitoral a mera orientação, especialmente diante da amplitude comunicativa das manifestações inerentes à cultura organizacional de uma empresa.